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quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Rebelião de Shimabara e Amakusa:Os últimos samurais cristãos


Estátuas budistas de Jizō, o "bosatsu de misericórdia", decapitadas pelos samurais cristãos.



Momentos antes de partir para a batalha, um samurai se ajoelha diante de uma cruz e reza, pedindo proteção a Deus. A seguir, ele se junta a uma milícia cujo estandarte é uma bandeira que retrata dois anjos e o cálice sagrado. No alto do tecido branco, lê-se a inscrição “Louvado seja o Santíssimo Sacramento”. Pode parecer surreal, mas cenas como essas aconteceram em pleno Japão feudal. A rebelião de Shimabara, iniciada em 1637 e sufocada pelas tropas do governo no ano seguinte, envolveu quase 40 mil japoneses. Muitos deles eram católicos e se opunham à proibição do cristianismo no país. Depois que os "rebeldes" foram massacrados, cristãos e estrangeiros foram perseguidos sem trégua e expulsos do Japão.

A rebelião deve seu nome à cidade de Shimabara, localizada na ilha de Kyushu, ao sul do país. A região passou a ser vista pelo governo como uma ameaça à unidade do Japão devido a sua grande população católica. A religião era uma influência direta dos portugueses, cujo primeiro contato com os japoneses tinha sido justamente em Kyushu, onde aportaram em 1543, na cidade de Tanegashima. E o porto de Nagasaki, na parte oeste da mesma ilha, foi a principal porta de entrada de embarcações vindas de Portugal entre os séculos 16 e 17.

Apelidados de nanban-jin (a tradução literal é “bárbaros do sul”), os portugueses logo tomaram conta das ruas de Nagasaki. Senhores feudais de Kyushu tornaram-se cristãos para ganhar a simpatia do povo e dos comerciantes estrangeiros. Em princípio, isso não afetava o poder central. Oda Nobunaga, que governou o Japão de 1567 a 1582, chegou até a incentivar o trabalho dos jesuítas para enfraquecer a influência dos monges budistas (com quem disputava poder político).

Mas...a pregação da necessidade de ser batizado e ser membro da unica Igreja de Cristo começou a bater de frente com a hierarquia imposta pelo xogum – desde o século 12, esse era o nome da autoridade que detinha o poder militar, executivo e judiciário no Japão. Em 1603, o xogum Ieyasu Tokugawa havia tomado o poder no país, unificando à força as várias partes do território, controladas por diferentes senhores feudais. Preocupado com a ascensão da religião trazida pelos portugueses, Ieyasu levou seu filho e sucessor, Hidetada, a proibir o cristianismo em 1614. Naquela época, já havia cerca de 300 mil japoneses convertidos.

A proibição, entretanto, foi ignorada. Contrariado, Hidetada mandou executar quatro missionários estrangeiros em 1617, no primeiro ato contra cristãos no Japão. Pouco depois, em 1622, começaram os massacres. Naquele ano, 22 cristãos foram queimados e 30, decapitados. Dois anos depois, a população de Nagasaki já tinha caído de 50 mil para 30 mil habitantes devido às perseguições. Mas os executados tornavam-se mártires e a repressão teve efeito contrário ao pretendido pelas autoridades: a fé dos camponeses só aumentava.

Em Shimabara os conflitos se acentuaram em 1630, quando Shigeharu Matsukura tornou-se o senhor feudal que controlava a cidade. Sua fama era de repressor: ele ordenava aos soldados que ateassem fogo a cristãos vestidos de casacos de palha de arroz. Além disso, implantou um imposto que cobrava dos lavradores 80% do produzido. Esse foi o estopim da rebelião de Shimabara. “Os lavradores passavam fome, havia muita pobreza”, diz Koichi Mori, especialista em cultura japonesa da Universidade de São Paulo. “A população havia sobrevivido a calamidades naturais como seca, má safra e terremotos.”

Amakusa Shirō (天草 四郎), foi um ronin japones. Shiro, com apenas dezesseis anos, torna-se líder da Rebelião Shimabara, escolhido entre os outros quatro ronin que participaram da insurreição, por uma profecia atribuída a São Francisco Xavier, encontrada no texto deixado por um missionário jesuíta, expulso do Japão vinte e cinco anos antes, e contida em uma poesia onde se dizia que chegaria um rapaz "ame no tsukai" (em português "enviado do céu") que teria evangelizado o Japão.


Estátua de Amakusa Shiro no castelo Hara

Da escolha do líder até o fim de 1637, vários levantes ocorreram. Camponeses atearam fogo a casas, destruíram templos budistas e agrediram oficiais do governo. Em 5 de dezembro, Shiro Amakusa e os 'rebeldes' invadiram o castelo abandonado de Hara, a 32 quilômetros de Shimabara. O local foi escolhido porque ficava em um cume e era cercado por fossos de água, o que facilitava o isolamento e a defesa.

Vários livros de história descrevem que, em momentos de desespero, os camponeses se apoiavam na fé, levantando cruzes e bandeiras brancas. Para adquirir coragem, rezavam e gritavam os nomes de Jesus Cristo e da Virgem Maria. Em uma escavação arqueológica na fortaleza, iniciada em 1992 com o patrocínio da prefeitura de Nagasaki, foram encontradas imagens de bronze de Jesus, Maria e São Francisco Xavier, além de cruzes e rosários.

Dos 37 mil "rebeldes" que se reuniram em Shimabara, quase metade eram mulheres e crianças. Entre os cerca de 20 mil homens, uma pequena parte eram ronins (como eram chamados os samurais desempregados, que não estavam servindo a nenhum senhor). Era considerado como um grande ato de penitencia ser ronin. 

Tomando conhecimento da revolta, o xogunato enviou tropas do Daimiô Itakura Shigemasa que, para tentar deter a revolta, aprisionou e torturou a mãe e as irmãs de Shiro, o qual decide entrincheirar-se dentro do castelo de Hara e combater o Daimiô com a ajuda dos camponeses católicos que o seguiam. No castelo se encontravam mais de 37.000 pessoas, sendo que cerca da metade era composta por esposas e filhos dos “soldados” que defenderam o castelo com armas leves, contra um exército regular composto por mais de 125.000 soldados comandados por Itakura Shigemasa e por Matsudaira Nobutsuna, este último, homem de confiança do xogum Iemitsu,[1] veio a substituir o primeiro depois de sua morte, que se deu durante um confronto com os insurretos. Shiro conseguiu defender-se por muito tempo, derrotando os adversários, inclusive conseguindo a morte de Itakura Shigemasa. Matsudaira Nobutsuna, sucendendo Itakura Shigemasa, decidiu aproveitar-se de seus aliados holandeses, fazendo-os destruir, com suas embarcações, os muros do castelo e em fim ensejando uma batalha final, onde Matsudaira Nobutsuna conseguiu derrotar os insurretos liderados por Shiro, visto que esses estavam cansados, com fome e sem munição. Amakusa e todos aqueles que estavam no castelo, incluidos as mulheres e crianças, foram decaptados. A cabeça do jovem ronin ficou exposta, sobre uma estaca, em Nagasaki como advertência aos "rebeldes" católicos.

Após a Rebelião Shimabara de 1637-1638, a repressão oficial de práticas cristãs foi combinada com uma política de isolamento nacional que durou mais de dois séculos. Com o advento das potências ocidentais e reabertura do Japão na década de 1850 e as reformas da Restauração Meiji, a atividade missionária foi renovada e um número de cristãos ocultos ressurgiu. Oura Catedral de 1864 é a primeira das igrejas construídas nos anos subsequentes

Em 1863, dois padres da Sociedade para as Missões Estrangeiras de Paris, os padres Louis Furet e Bernard Petitjean, chegaram a Nagasaki com a intenção de construir uma igreja em honra aos Vinte e Seis Mártires do Japão, nove padres europeus e dezassete cristãos japoneses foram crucificados em 1597, por ordem de Toyotomi Hideyoshi. A igreja foi terminada em 1864

Em 17 de março de 1865, logo depois da finalização da catedral original, Ôura Catedral, o padre Bernard Petitjean viu um grupo de pessoas em pé na frente da catedral, que pediram-lhe para abrir as portas. Enquanto o padre se ajoelhava no altar, uma idosa do grupo aproximou-se dele e disse: "Nós temos o mesmo sentimento em nossos corações como tu. Onde está a estátua da Virgem Maria?" Pe. Petitjean descobriu que essas pessoas eram da aldeia vizinha de Urakami e que eram Kakure Kirishitans (cristãos escondidos), descendentes dos primeiros cristãos japoneses que passaram a se esconder após a Rebelião de Shimabara na década de 1630. Uma estátua branca de mármore da Virgem Maria foi importada da França e erguida na igreja para comemorar este evento. O revelo de bronze no pátio da igreja mostra a cena memorável da descoberta. Em pouco tempo, dezenas de milhares de cristãos clandestinos por fim deixaram de ser esconder na área de Nagasaki. As notícias deste acontecimento chegaram ao Beato Papa Pio IX, que declarou isto como "o milagre do Oriente."

Catedral Ôura em Nagasaki.


Christus Vincit, Christus Regnat, Christus Imperat!

Algumas partes foram extraídas de guiadoestudante e wikipedia com modificações do texto original.



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